quinta-feira, 6 de novembro de 2014

COMO ESTARÁ LUIZA?

Era o amor garantido, de noites em frente a TV, comida pronta todos os sábados, pernas entrelaçadas no sofá. Aquela relação que não permitia mudanças, mas gerou resultados: uma mulher insatisfeita, incomodada, esmagada. E um homem que cego pelo comodismo só abriu os olhos quando foi deixado para trás.
Luiza tentou avisar, com os olhos apagados ao aceitar tantas vezes as saídas sem avisar, os jantares intermináveis regados à explicações sobre suas ausências.
“ Paulo estava cansado”
“ Acho que ele trabalhou até mais tarde”
Mas foi o cansaço dela que abandonou a cama onde ele passou a se ver pequeno diante do espaço que brigava com seu corpo. Foram suas tentativas vazias de se aproximar de um homem fechado e orgulhoso de seu receio de amar que deixaram apenas um prato na mesa do jantar, o apartamento escuro quando ele chegava do trabalho.
A partida de Luiza deu ao rosto de Paulo um contorno amargurado, de alguém espantado com o sentimento ao qual se julgava imune. A falta de Luisa o fez um estranho dentro de si mesmo, tendo que lidar com uma realidade que não avisou a hora de sua chegada: sorrateira, não pediu licença e nem permissão para tomá-lo de assalto, sem pena.
E quando ele achava ter se acostumado com os fins de semana solitários, os frascos vazios dos shampoo  que  não tinha coragem de jogar fora a viu: luminosa, com aquele sorriso de quem encontrou o próprio caminho. Disse um oi como se cumprimentasse um velho amigo do ensino médio e um abraço que dividiu seu coração ao meio.
Ansioso, a viu entrar no cinema com um grupo de pessoas que não conhecia, os saltos vermelhos que ele adorava a decorar o chão branco do shopping.
 Linda, dolorosamente linda, sem ao menos reparar em Paulo com os olhos a varrer os rostos que o observavam com pena, perdido a segurar o copo de café que lhe queimava os dedos e a canção de Tom Jobim, tantas vezes sua favorita a machucar seus ouvidos:

“ O que eu faço para te esquecer, Luiza?”

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